O Que Vive Dentro das Nossas Casas ( este artigo não é sobre decoração)



Esta semana li dois artigos que que ficaram a borbulhar dentro de mim, um foi no Linkedin e era uma opinião pessoal, de um brasileiro, sobre como escrever bons textos. Para mim este é o povo que melhor sabe comunicar no mundo pelo que devorei o texto e rapidamente compreendi que a solução é afinal tão simples. Para escrever bons textos é preciso ir pensado nisso ao longo do dia, tirar umas notas para não esquecer de nada, umas fotos podem ajudar e depois é sentar e escrever, naturalmente, como se estivesse a conversar com um amigo numa mesa de café.
O outro aparecia em destaque num aglomerador de noticias. Era sobre casas, ou melhor, sobre a casa que a autora do texto habitava nos Estados Unidos, tudo o que ela tinha feito para recuperar aquela casa, algumas fotos onde se notam múltiplas influencias, fruto de tudo o que ela herdou. Não tendo comprado nada, aquela casa vive um ambiente tranquilo e acolhedor como seria de esperar.


Foi aí que me lembrei de escrever sobre a minha casa, um pouco ao jeito do que fui lendo durante esta semana. Não vos vou levar numa visita guiada por lá, vou mostrar-vos somente pequenos apontamentos do que eu respiro quando estou realmente no meu mundo.
Moro exatamente na casa que tem tudo para me fazer feliz. Adoro casas antigas, de soalho de madeira corrido, tetos altos e cores quentes e claras onde morou muita gente e apesar disso os tons de branco se afirmam e gosto de quintais, o ultimo reduto da vizinhança à moda antiga, onde é possível sermos mais humanos e mais ligados uns com os outros.




A minha casa conta histórias mas só para quem conhece os detalhes. A maior parte das peças que por lá estão foram de alguém ou dadas por alguém, lá dentro delas, vive quem mas confiou e tê-las comigo é uma forma de ter tanta gente presente em casa. Nas paredes, os meus filhos vivem rodeados de corações brancos, acho que sem querer representei o amor mais profundo e mais puro que alguma vez sentirei. A foto, já antiga, vai por lá ficar para nenhum de nós se esquecer que o tempo passa, eles crescem mas para nós nada muda.

Noutra parede uma pomba representa a paz, veio do Brasil, numa das minhas ultimas viagens em serviço e junto com a paz representa também todas as viagens que fiz, todas as pessoas que conheci, tudo o que aprendi ao ter contacto com outros povos e outras culturas. Se de um lado estão representados os valores da família, aqui estão os valores fundamentais para viver em sociedade e que incluem chavões como a tolerância, aceitação da diferença, a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro, não julgarmos porque não conhecemos, simplesmente viver e deixar viver.

Na sala de estar, em cima de uma aparelhagem vintage, que nos acompanha há mais de 25 anos e que apesar de não estar na moda tencionamos conservar, uma deusa indiana representa o respeito e a amizade. Todos os anos um amigo vem da India e todos os anos me entrega uma lembrança que representa uma amizade com algum tempo. A separar-nos temos as grandes diferenças culturais para além da distancia, a unir-nos o espirito de todo o viajante que nunca se cansa de descobrir e de se maravilhar com essas descobertas. A amizade pode acontecer de formas estranhas, nem sempre que está perto é quem nos aceita e pode ser preciso ir longe para tudo ter um novo sentido.       




Os espelhos, adoro espelhos mesmo sabendo que representam a vaidade. Gosto de muitos, de vários tamanhos e modelos, gosto de ver pedaços de outras coisas refletidos neles, vê-los projetar pedacinhos da realidade criando uma nova, que depois se desvanece num ápice, para logo de seguida entrar em cena novos pedaços de coisas que vão construir novas realidades efémeras…os espelhos são como um jogo onde podemos só ver aquilo que queremos ou se ficarmos atentos, podemos ver passar pequenos detalhes que nos levam para novos mundos, aproveitem os vossos espelhos e deixem-se levar.


Junto aos espelhos uma peça antiga, minha, ainda vive. Apesar de muitas quedas, continua a representar a beleza. Não somos intactos para sempre, damos tombos e alguns são bem fortes. Dentro de nós pequenos pedaços se quebram e já não se recuperam, nesse lugar coloque uma flor, não reconstrói o que perdeu mas garanto que ganha uma nova beleza. E claro nunca se esqueça, por mais tombos que tenha dado, mais recentes ou mais antigos, um colar ao pescoço e um chapéu de palha vão fazer milagres pela sua alma dorida.


Noutro canto, um conjunto de malas antigas representam a família e as viagens. Na parede a bicicleta, símbolo do Teresa Vai de Férias e que representa a simplicidade e o prazer de sentir o ar a bater na cara enquanto nos deixamos levar ao sabor do vento.  

Qualquer casa tem de ter uma cadeira de baloiço. Eu via isso nos filmes antigos americanos e achava que aquele  símbolo era o que melhor representa a América profunda. Uma cadeira de baloiço num alpendre de uma tarde de Verão, em que os miúdos desapareciam pelos campos de trigo e as mulheres arranjavam vagens enquanto os mais idosos descansavam na sua cadeira de baloiço, embalados pela madorna entorpecedora do calor de um qualquer final de dia.

E por fim o bom humor porque sem boa disposição esta travessia pode ser um deserto. Aproveitar os momentos e leva-los para nossa casa, não ter uma casa de sonho, perfeita e equilibrada mas ter a casa dos nossos sonhos, perfeita nas suas diferenças, olhar à volta e reconhecer nela pedaços da nossa vida passada e daquilo que nos representa, trocar sinais de riqueza por pedaços de valores e de vida. Ter uma casa única, carregada de histórias e de detalhes. Quando vamos a casa de alguém nunca pensamos em tudo isto, verdade?   

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